Edinei Muniz
Quando João Sem Terra, em 1215, foi obrigado pelos "barões de ferro", a outorgar aos seus súditos a "Magna Carta", transformou o panorama jurídico da Inglaterra, reconhecendo um "direito" até então inexistente nas outras legislações: o "direito do homem à liberdade individual".
Os "interditos romanos" (de liberis exhibendis e de homeni libero exhibendo), as "cartas de seguros" ou "cartas tuitivas" (literae tuitivae) das Ordenações do Reino, os "salvo-condutos" de outros povos e as "ações de liberdade", dos sistemas processuais do Império brasileiro eram apenas concessões, mais ou menos liberais, do Poder Público aos cidadãos ou vassalos, e jamais direitos destes.
Foi a Magna Carta, portanto, bem antes da Revolução Francesa, que firmou o princípio de um dos mais importantes "direitos do homem", o direito à sua liberdade individual, contra a prepotência estatal, ou de seus representantes legais.
Reconhecido o direito do cidadão, ainda foram precisos mais de quatrocentos anos para surgir o processo pelo qual se defenderia a liberdade individual. E assim apareceu o instituto do habeas corpus - the remedial mandatory writ, em 1679 - com o objetivo de garantir aquele direito, sempre burlado pelos mais poderosos, embora ainda de finalidade estrita e que só foi ampliada, em 1816, por outra lei inglesa.
Este fato foi a primeira vitória das reivindicações populares; a segunda foi a "Declaração dos Direitos" do Estado de Virgí¬nia, nos Estados Unidos da América do Norte, e a terceira, a famosa Declaração dos Direitos do Homem, em 1789, pela Revolução Francesa, dando início, com uma nova concepção de Estado, ao moderno "direito público", baseado na idéia de que toda a soberania emana do povo e não mais do poder absoluto do rei. A tais vitórias, pode¬mos acrescentar a "Carta do Atlântico", já de nossos dias, pelas suas afirmações democráticas. E permita Deus que os nossos descendentes saibam defender estas prerrogativas, porque, de outra forma, acabarão servos do Estado, como servos já são vários povos da terra.
Tão grande foi a influência daquelas novas concepções jurídicas que deixaram de ser simples dispositivos do Código de Processo para entrarem no âmbito do Direito Constitucional, passando a figurar em quase todas as Constituições Políticas, até mesmo a dos países onde não existe o instituto do habeas corpus.
No Brasil, por exemplo, a Constituição do Império, no seu art. 179, § 8.°, já afirmava que "ninguém poderá ser preso sem culpa formada, exceto nos casos declarados em lei", enquanto que o Código Criminal, da mesma época (1832), adotando o instituto do habeas corpus, fixava a maneira de exercê-lo, dizendo: "Todo o cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade tem direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor". Estava, pois, dentro do direito brasileiro, constitucionalmente e processual¬mente, o "direito do cidadão à liberdade individual", na concepção de que tal medida não era uma simples concessão do Poder Público, mas um privilégio impostergável do homem.
Rui Barbosa, mesmo defendendo o poder amplo do habeas corpus, dizia que "o habeas corpus não poderia ficar restrito à simples pessoa corporal porque as pessoas não são unicamente as entidades físicas, senão também os direitos que as envolvem, os direitos a que a sua existência está ligada, os direitos em que cada uma delas se desenvolve".
A nossa opinião sobre o assunto é de que o habeas corpus deve ser o remédio ideal contra todas as violências e abusos de poder contra o cidadão, mesmo aqueles e aquelas que estejam fora do âmbito do direito de locomoção, sempre que na legislação nacional não exista uma garantia equivalente, como, por exemplo, o "mandado de segurança". Isto porque não é apenas o direito de locomoção que deve ser rapidamente salvaguardado, mas todos os direitos individuais, mesmo porque de nada valeria a enumeração constitucional de tais direitos (como se dá em várias constituições políticas) se não se desse ao cidadão a maneira de preservá-los e garanti-los imediatamente. No Brasil o habeas corpus pode ser empregado restritiva¬mente porque aqui existe o mandado de segurança, porém nos países onde esta última garantia não existe é o habeas corpus que deve substituí-lo, com a extensão que Rui Barbosa lhe dava.
Quando João Sem Terra, em 1215, foi obrigado pelos "barões de ferro", a outorgar aos seus súditos a "Magna Carta", transformou o panorama jurídico da Inglaterra, reconhecendo um "direito" até então inexistente nas outras legislações: o "direito do homem à liberdade individual".
Os "interditos romanos" (de liberis exhibendis e de homeni libero exhibendo), as "cartas de seguros" ou "cartas tuitivas" (literae tuitivae) das Ordenações do Reino, os "salvo-condutos" de outros povos e as "ações de liberdade", dos sistemas processuais do Império brasileiro eram apenas concessões, mais ou menos liberais, do Poder Público aos cidadãos ou vassalos, e jamais direitos destes.
Foi a Magna Carta, portanto, bem antes da Revolução Francesa, que firmou o princípio de um dos mais importantes "direitos do homem", o direito à sua liberdade individual, contra a prepotência estatal, ou de seus representantes legais.
Reconhecido o direito do cidadão, ainda foram precisos mais de quatrocentos anos para surgir o processo pelo qual se defenderia a liberdade individual. E assim apareceu o instituto do habeas corpus - the remedial mandatory writ, em 1679 - com o objetivo de garantir aquele direito, sempre burlado pelos mais poderosos, embora ainda de finalidade estrita e que só foi ampliada, em 1816, por outra lei inglesa.
Este fato foi a primeira vitória das reivindicações populares; a segunda foi a "Declaração dos Direitos" do Estado de Virgí¬nia, nos Estados Unidos da América do Norte, e a terceira, a famosa Declaração dos Direitos do Homem, em 1789, pela Revolução Francesa, dando início, com uma nova concepção de Estado, ao moderno "direito público", baseado na idéia de que toda a soberania emana do povo e não mais do poder absoluto do rei. A tais vitórias, pode¬mos acrescentar a "Carta do Atlântico", já de nossos dias, pelas suas afirmações democráticas. E permita Deus que os nossos descendentes saibam defender estas prerrogativas, porque, de outra forma, acabarão servos do Estado, como servos já são vários povos da terra.
Tão grande foi a influência daquelas novas concepções jurídicas que deixaram de ser simples dispositivos do Código de Processo para entrarem no âmbito do Direito Constitucional, passando a figurar em quase todas as Constituições Políticas, até mesmo a dos países onde não existe o instituto do habeas corpus.
No Brasil, por exemplo, a Constituição do Império, no seu art. 179, § 8.°, já afirmava que "ninguém poderá ser preso sem culpa formada, exceto nos casos declarados em lei", enquanto que o Código Criminal, da mesma época (1832), adotando o instituto do habeas corpus, fixava a maneira de exercê-lo, dizendo: "Todo o cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade tem direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor". Estava, pois, dentro do direito brasileiro, constitucionalmente e processual¬mente, o "direito do cidadão à liberdade individual", na concepção de que tal medida não era uma simples concessão do Poder Público, mas um privilégio impostergável do homem.
Rui Barbosa, mesmo defendendo o poder amplo do habeas corpus, dizia que "o habeas corpus não poderia ficar restrito à simples pessoa corporal porque as pessoas não são unicamente as entidades físicas, senão também os direitos que as envolvem, os direitos a que a sua existência está ligada, os direitos em que cada uma delas se desenvolve".
A nossa opinião sobre o assunto é de que o habeas corpus deve ser o remédio ideal contra todas as violências e abusos de poder contra o cidadão, mesmo aqueles e aquelas que estejam fora do âmbito do direito de locomoção, sempre que na legislação nacional não exista uma garantia equivalente, como, por exemplo, o "mandado de segurança". Isto porque não é apenas o direito de locomoção que deve ser rapidamente salvaguardado, mas todos os direitos individuais, mesmo porque de nada valeria a enumeração constitucional de tais direitos (como se dá em várias constituições políticas) se não se desse ao cidadão a maneira de preservá-los e garanti-los imediatamente. No Brasil o habeas corpus pode ser empregado restritiva¬mente porque aqui existe o mandado de segurança, porém nos países onde esta última garantia não existe é o habeas corpus que deve substituí-lo, com a extensão que Rui Barbosa lhe dava.
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