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Inquérito baseado exclusivamente em grampo é nulo

Por Gláucia Milício

É manifestamente nulo o inquérito policial baseado somente em interceptação telefônica — ainda mais se existem outras formas de investigação à disposição da autoridade policial. O entendimento foi reafirmado recentemente pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Os ministros analisaram o caso da operação batizada como Cana Brava, deflagrada no ano passado pela Polícia Federal, para apurar sonegação de R$ 500 milhões. O relator do recurso foi o ministro Jorge Mussi, que durante 20 anos atuou como advogado criminalista.

O Habeas Corpus foi ajuizado pela defesa dos empresários da CAP (Companhia Açucareira de Penápolis), presos durante a operação em 2008, mas já em liberdade. A defesa dos empresários foi patrocinada pelo advogado Celso Vilardi. No STJ, Vilardi sustentou que as interceptações telefônicas, autorizadas no início da investigação pelo Juízo da 1ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Araçatuba (SP), não dispunha de qualquer fundamentação quanto à indispensabilidade e à imprescindibilidade da medida. Isso porque, no caso, havia outros meios de prova disponíveis. O argumento foi aceito e os ministros reconheceram a ilegalidade das provas.

“Na ocasião, o ministro Napoleão Maia chegou a dizer que o caso era absurdo. Isso, depois de o procurador da República oficiante afirmar que apoiava a impetração nesse sentido”, ressaltou Vilardi. Para o advogado, o julgamento é importante porque se tornou um precedente em relação a decretação de interceptação telefônica, principalmente quando existir outros meios de investigação. Vilardi destaca que a decisão é inédita pelo fato de a fundamentação da decisão da instância inferior ter sido declarada insuficiente pelo STJ.

Ainda segundo ele, nos autos havia solicitação para proibição de escuta telefônica entre advogado e cliente. Isso porque havia um diálogo transcrito nos autos de uma advogada com um dos acusados, quando falavam sobre a estratégia do caso.

Histórico
Em junho de 2008, a Polícia Federal deflagrou a operação batizada como Cana Brava, baseada em interceptações telefônicas de diversas pessoas, autorizadas pelo Juízo da 1ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Araçatuba (SP). Na ocasião, a PF recebeu relatórios da Secretaria da Receita Previdenciária, para investigações de crimes de apropriação indébita pela CAP, indicando débito superior a R$ 5 milhões com a Previdência Social.

Antes disso, em março de 2006, foi instaurado inquérito policial, por solicitação do Ministério Público Federal, para a suposta prática do crime de apropriação indébita previdenciária, cuja materialidade do crime foi baseada pela inscrição da CAP na dívida ativa da união.

Por três vezes, os sócios da Companhia Açucareira de Penápolis foram intimados a prestar esclarecimentos na Polícia Federal em Araçatuba, mas os depoimentos foram cancelados pela PF.

A defesa dos empresários ressalta também que, em outubro de 2007, antes mesmo de os sócios da CAP prestarem depoimento na PF, a Polícia entrou com pedido de interceptação telefônica de diversas pessoas indicadas em uma tabela com nomes, operadora e telefone, mas sem qualquer indicação do modo com que se relacionam com os fatos investigados.

O advogado conta que, segundo a autoridade policial, era necessário “identificar os responsáveis pela temerária gestão levada a efeito no âmbito da CAP e das empresas associadas bem como o “modus operandi” dos envolvidos, para com isso, cobrar o prejuízo acumulado e estancar as perdas de valores dos cofres públicos”.

Ele acrescenta que a atuação da PF apoiou-se em relatório da Receita Federal “que nada mais é do que uma proposta de mandado de busca e apreensão (MBA), bloqueio de contas bancárias e quebra de sigilo bancário, fiscalizações e diligências, acompanhada por relatório complementar no qual foi sugerida a interceptação telefônica na época”.

HC 99.990

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