Hoje contarei uma história que se passou comigo na infância, lá pelos 8 anos de idade. O fato se deu na “Colocação Pau-Pina”, do famoso "Seringal Cachoeira", em Xapuri. Minha avó materna - que Deus a tenha em bom lugar - era posseira da área e, nas férias escolares, comumente me mandavam para lá.
O Seringal Cachoeira sempre teve fama de mal-assombrado. Confesso que muitas histórias percorriam a minha cabeça e que tinha verdadeiro pavor de dormir no local. À noite, tinha tanto medo, que faltava coragem até para abrir os olhos e mirar em direção à mata. O som dos animais noturnos - todos juntos ao mesmo tempo - aterrorizavam minha mente de menino da cidade.
Certa vez, na lua cheia, lá pela meia noite, levado não sei até hoje por quais forças - por coragem minha é que não foi - pulei uma das janelas do casarão e ganhei a mata. Na minha memória ainda resta uma vaga lembrança de que “flutuava” próximo à copa das árvores e que não sentia nenhum medo naquele momento.
A sorte é que meus familiares ficaram acordados até mais tarde da noite naquele dia, pois estavam fazendo, se bem me lembro, algum tipo de doce na cozinha.
Minha irmã mais velha, que era quem normalmente dormia comigo na rede, foi a primeira a perceber a ausência, e aí começou o desespero. Aos berros, feito uma louca, anunciou o ocorrido: "meu maninho sumiu, meu maninho sumiu".
Imediatamente, uma diligência foi realizada nas proximidades da casa, e nada de encontrarem o pequeno viajante. Foi aí que meu tio, caçador habilidoso, teve uma feliz idéia, pegou uma blusa, deu para os cachorros cheirarem, e lá foram eles em busca do desaparecido.
Fui acordado pelo som da matilha no meu pé do ouvido. Estava dentro do buraco de um antigo “defumador” de seringa, abandonado há mais de 50 anos e que ficava a uma distância de pelo menos um quilômetro do local de onde saí para o estranho passeio.
Dizem que tal defumador fora utilizado por um seringueiro que teria sido assassinado muitos anos antes. Este mesmo seringueiro, segundo dizem os contadores de histórias, costumava "aparecer espiritualmente" em busca de alguém que se habilitasse a pagar - por ele - uma promessa a São Sebastião, pois morrera sem cumprir o débito com o santo, motivo pelo qual, de acordo com a lenda, sua alma penava sem conseguir subir para o lugar destinado aos bons cristãos.
Pois bem, voltando à história, o que até hoje paira sem explicação é que quando me encontraram estava sem nenhum “arranhão” no corpo, mesmo tendo, em tese, atravessado uma capoeira bastante densa para chegar ao local.
Ainda hoje, 28 anos depois, essa história ainda permanece viva no imaginário dos moradores mais antigos do Seringal Cachoeira. Contam eles para os mais novos que fui levado pelo “caboclinho da mata”, o guardião dos animais da floresta.
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