Pular para o conteúdo principal

Pesquisa


Proposta de nova lei segue sem acordo


Agência Estado


SÃO PAULO - Um dos maiores entraves para fazer pesquisas de bioprospecção no Brasil é a legislação. E isso nem é reclamação apenas dos pesquisadores e empresas, mas uma situação reconhecida pelo próprio governo.

Mas quando, enfim, a Casa Civil colocou em consulta pública o anteprojeto de lei (APL) que deveria corrigir as distorções da Medida Provisória que rege a questão desde 2001, ele se mostrou uma colcha de retalhos que tentava agradar todo mundo, mas que no final das contas não agradou ninguém.

Para Rute Gonçalves Andrade, uma das representantes da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) nas discussões, o novo projeto ainda ignora um dos principais pedidos dos pesquisadores que é o de descriminar a pesquisa.

"Hoje para um projeto ser aprovado é preciso passar pela análise de vários comitês de ética. Isso já é um controle. Além disso queremos que as próprias instituições possam se responsabilizar pelos seus pesquisadores", afirma.

Apesar das críticas, ela pondera que talvez tenham ocorrido alguns avanços. "Quando saiu o APL, líamos tudo aquilo com a impressão de que nada tinha mudado. Com uma leitura mais atenta ao longo dos meses, conseguimos já vislumbrar algumas melhoras, mas, ainda assim, não está bom, tem de facilitar a pesquisa", comenta a pesquisadora.

Um dos pontos questionados é o que prevê que, quando uma determinada substância é descoberta com o auxílio do conhecimento tradicional, logo se faça um contrato que garanta a repartição de eventuais lucros que sejam obtidos.

"Acreditamos que essa exigência só deva valer quando a pesquisa de fato avançar para o desenvolvimento de um produto com um parceiro comercial. Antes disso só cria entrave para a pesquisa, além de gerar uma ansiedade que pode não se comprovar. Na prática sabemos que, de tudo que é coletado, nem 1% pode de fato originar um produto", defende o biólogo Carlos Joly, da Unicamp.

Ele questiona ainda que o APL não trouxe avanços pontuais que tinham sido obtidos desde a edição da MP. "É um retrocesso. Ele simplesmente despreza todas as negociações que fizemos ao longo desses anos."

Para Braulio Dias, diretor de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, algumas exigências que vêm sendo feitas pela academia são legítimas, mas outras não. "De fato o texto que foi à consulta pública é um ajuntamento de propostas de vários setores. Mas há o compromisso de enxugar, tornar o texto limpo e coerente, incorporando as sugestões que conciliem os diversos interesses", afirmou. "Claro que talvez permaneçam alguns pontos conflitantes, mas o governo está sensível para o fato de que o País precisa de uma lei que resolva a questão."

O texto do anteprojeto de lei ficou disponível para comentários e sugestões até meados de julho e agora está de volta à Casa Civil para incorporações e ajustes, antes de ir para o Congresso.

MEDIDAS PREVISTAS NO ANTEPROJETO DE LEI

AGROBIOVIVERSIDADE - Novo conceito que se refere apenas às espécies usadas na agricultura, que teriam tratamento diferenciado do resto da biodiversidade

CNACT - Cadastro Nacional de Controle de Atividades de Pesquisa Científica ou Tecnológica de Recursos Genéticos. Administrado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia para registrar todos os cientistas e atividades relacionados ao estudo da biodiversidade

CNGEN - Cadastro Nacional de Acesso aos Recursos Genéticos e ao Conhecimento Tradicional Associado. Vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), para o registro de atividades envolvendo o uso de recursos genéticos e/ou de conhecimento tradicional

CNAB - Cadastro Nacional de Agrobiodiversidade. Gerenciado pelo Ministério da Agricultura, para o controle de atividades envolvendo recursos genéticos e uso de conhecimentos tradicionais relacionados à agrobiodiversidade

AGROBIO - Órgão Gestor do Recurso Genético Proveniente da Agrobiodiversidade, que seria criado para gerenciar o CNAB e proteger os direitos dos agricultores

CIDE - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. Imposto que incidiria sobre a exploração comercial de recursos genéticos e conhecimentos tradicionais, com alíquotas de 1% a 2%

FURB - Fundo de Repartição de Benefícios do Recurso Genético dos Conhecimentos Tradicionais Associados, um fundo vinculado ao MMA que receberia metade dos recursos arrecadados pela Cide para uso em políticas de conservação da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Astronomia: Milhares de cometas escuros podem colidir com a Terra

Da Lusa - Agência de Notícias de Portugal Londres, (Lusa) - Milhares de cometas que circulam no sistema solar podem ser um perigo para a Terra, por serem indetectáveis, o que dificulta a antecipação de um eventual impacto, alertaram quarta-feira vários astrónomos britânicos. São cerca de três mil os cometas que circulam no sistema solar e apenas 25 podem ser avistados a partir da Terra, lê-se no artigo da revista "New Scientist", assinado por Bill Napier, da Universidade de Cardiff, e por David Asher, astrónomo do Observatório da Irlanda do Norte. "Devemos alertar para o perigo invisível mas significativo que são os cometas escuros", dizem os astronómos, explicando que um cometa fica escuro quando perde a cola brilhante. Desprovido desta substância, "o trajecto de um cometa que esteja em rota de colisão com o planeta Terra pode passar despercebido ao telescópio", afirmam Napier e Asher. Nos últimos séculos, o cometa de que há registo de ter passado mais pr

Os Farrapos dos olhos azuis

Cláudio Ribeiro - Demitri Túlio, do Jornal O Povo, de Fortaleza A íris clara, azulzíssima em muitos deles, é a digital do povo Farrapo. Também é da identidade a pele branca avermelhada, carimbada pelo sol forte que não cessa em Sobral. Isso mais entre os que vivem na zona rural. Gostam de exaltar o sobrenome. É forte. Farrapo não é apelido. Não são uma etnia, mas são tratados assim. São “da raça dos Farrapos”, como nos disse quem os indicou a procurá-los. Os Farrapos têm história a ser contada. Praticaram a endogamia por muito tempo. Casamentos em família, entre primos, mais gente do olho azul de céu que foi nascendo e esticando a linhagem. Sempre gostaram de negociar, trocar coisa velha. São um pouco reclusos. Vivem sob reminiscências de judaísmo. Há estudo disso, mas muito ainda a ser (re)descoberto. Os Farrapos são citados, por exemplo, no livro do padre João Mendes Lira, Presença dos Judeus em Sobral e Circunvizinhanças e a Dinamização da Economia Sobralense em Função do Capital Ju

Erros judiciários: Caso Mignonette - Estado de necessidade

A 5 de Julho de 1884 naufragou o iate inglês La Mignonette. Depois de vários dias no mar, o imediato, que era o mais jovem de todos, foi morto pelos companheiros, que mais tarde alegaram estado de necessidade perante o júri. Sustentaram que não teriam sobrevivido caso não se utilizassem do cadáver para matar a fome. O júri deu um "veredicto especial", reconhecendo apenas a matéria de fato, mas deixando a questão jurídica para que a corte superior decidisse. Lord Coleridge, um dos juízes superiores, disse, entre outras considerações, o seguinte: Conservar a própria vida é, falando em geral, um dever: mas sacrificá-la pode ser o mais claro e alto dever. A necessidade moral impõe deveres dirigidos não à conservação mas ao sacrifício da sua vida pelos outros. Não é justo dizer que há uma incondicionada e ilimitada necessidade de conservar a própria vida. Necesse est ut eam, non ut viram (é necessário que eu caminhe, não que eu viva) disse Lord Bacon. Quem deve julgar o estado de