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Polêmica na anistia das dívidas de filantrópicas

Karla Correia, Jornal do Brasil

BRASÍLIA - O Ministério Público Federal no Distrito Federal estuda entrar com ação civil pública contra um verdadeiro presente de fim de ano dado pelo governo a entidades filantrópicas de todo o país. Trata-se da Medida Provisória 446, publicada no Diário Oficial da União de segunda-feira, que anistiou todas as organizações que tinham pedidos de concessão apresentados ao governo federal pela obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas). Isso inclui aquelas entidades que, por apresentarem irregularidades ou não-conformidade com exigências legais, tinham apresentado recurso pela revisão de seus processos.
A generosidade do governo com as entidades filantrópicas acontece sete meses depois que a Polícia Federal prendeu seis pessoas ligadas ao Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), órgão responsável pela concessão do certificado a entidades beneficentes, durante a Operação Fariseu. Deflagrada em março, a operação investigou suspeitos de concederem títulos de filantropia em troca de propina.
No espírito de promover a transparência do processo de certificação das filantrópicas, o governo editou um projeto de lei transferindo do CNAS para os ministérios da Educação, da Saúde e do Desenvolvimento Social a competência de julgar os pedidos de certificação. Também foi criada uma força-tarefa com membros do Ministério Público, da PF e auditores fiscais para investigar organizações suspeitas de terem se beneficiado do esquema.
Agora, essas mesmas entidades serão beneficiadas no bolo de processos anistiados pelo governo, explica o procurador da República Pedro Machado.
– O que essa MP faz é conceder isenção de impostos a praticamente qualquer entidade que tenha pedido certificação, sem analisar processos, sem levar em consideração irregularidades encontradas – ataca o procurador. Segundo Pedro Machado, só os casos de organizações com recursos apresentados no Ministério da Previdência representaram, até 2007, uma renúncia fiscal de R$ 2,14 bilhões para os cofres do Tesouro.
– Mas o número de casos beneficiados com a medida e a cifra equivalente de renúncia fiscal é muito superior a isso.
Pressa no ministério
Desde 2004, quando começaram as investigações da Polícia Federal, o CNAS migrou da estrutura do Ministério da Previdência para a pasta do Desenvolvimento Social. De acordo com a secretária executiva do MDS, Arlete Sampaio, o órgão herdou um passivo de 8.357 processos, dos quais 1.274 foram atingidos diretamente por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que reduziu de 10 anos para cinco o prazo para cobrança de contribuições sociais.
– Fomos pegos de surpresa pela decisão que, na prática, obrigou o conselho a julgar esses mais de mil processos até dezembro deste ano – explica Arlete. Segundo ela, a intenção da medida provisória é zerar as pendências do conselho para dar partida no que seria o novo modelo de concessão de certificados para entidades filantrópicas. O prazo menor inviabilizaria a espera pela tramitação normal do projeto de lei, argumenta a secretária.
– É um equívoco achar que há simplesmente o perdão de uma dívida dessas entidades, uma vez que, com o indeferimento desses processos, elas seriam fechadas e não haveria como pagar esse passivo. Não estamos fazendo só uma anistia, estamos criando um modelo mais sério de certificação.
Para o procurador Pedro Machado, a existência de um projeto de lei no Congresso criando um novo modelo de certificação invalidaria a necessidade de uma medida provisória.
– Usar a decisão do STF como argumento para a medida é uma falácia. A princípio, quem tem urgência para aprovar uma anistia são as entidades, não o governo – pondera. – Para o governo, é claro que seria melhor para os cofres públicos cobrar cinco anos de impostos do que não cobrar nada de ninguém.

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