Pular para o conteúdo principal

Partido de (e para) profissionais

Lucia Hippolito - O Globo


Vitaminado pela expressiva vitória nas eleições municipais, tendo feito a maioria das prefeituras (cerca de 1.200), tendo aumentado de dois para seis seus prefeitos de capital, o PMDB vai à luta.
O campo de batalha, desta vez, é o Congresso Nacional, onde se travará a eleição para a presidência da Câmara e do Senado.
Não se trata de eleições rotineiras.
O Congresso inicia a segunda metade da legislatura, e presidentes de Câmara e Senado que forem eleitos em 2009 poderão ficar quatro anos no cargo.
A regra diz que o mandato é por dois anos, sem direito a reeleição dentro da mesma legislatura. Mas na segunda metade da legislatura é possível haver reeleição porque depois de dois anos começa uma nova legislatura.
Mais importante: os presidentes da Câmara e do Senado vão presidir a eleição do sucessor de Lula.
Para quem já declarou que faz questão de eleger o sucessor, o presidente precisa ter no comando das duas casas do Congresso aliados fiéis, que não lhe causem problemas.
Por quê? Muito simples. Tanto na Câmara quanto no Senado, o presidente é o responsável por colocar em votação todos os projetos que chegam ao plenário. Desde MPs até propostas de emenda constitucional.
Diz a lei que qualquer alteração no processo eleitoral deve ser votada até um ano antes da eleição. Portanto, alterações nas regras para as eleições de 2010 devem ser aprovadas até 30 de setembro de 2009.
Já imaginaram se alguém propõe redução do mandato do presidente, ou eleição indireta, ou terceiro mandato, ou mesmo a instalação da monarquia?!
Como sabemos muito bem, tem maluco para tudo.
Por isso, é importante ter no comando do Congresso gente afinada com o Planalto.
Quando se elegeram Arlindo Chinaglia (PT) para a Câmara e Renan Calheiros (PMDB) para o Senado, a combinação foi de inverter os partidos na eleição de 2009: PMDB na Câmara, provavelmente com Michel Temer, e PT no Senado, provavelmente com o vice-presidente Tião Viana.
Mas os lamentáveis episódios de 2007, quando o senador Renan Calheiros invadiu a privacidade dos brasileiros com suas estripulias sexuais, extraconjugais, pecuárias e radiofônicas, além de financeiras, é claro, arrastando a reputação do Senado na lama, Tião Viana assumiu interinamente a presidência da casa, com a licença de Renan.
E se comportou dignamente, tentando resgatar a dignidade do Senado. Sentiu-se confortável na cadeira e gostou da presidência.
Foi o suficiente para despertar a ira de Renan Calheiros.
Depois de escapar duas vezes da cassação, Renan conheceu um período de relativa discrição. Mas sentiu-se purificado pelo abraço redentor do presidente Lula, que declarou que Renan foi vítima de injustiça e deve ser reabilitado.
Foi o que bastou. Renan estufou o peito, engrossou a voz, retirou do cofre os segredos cabeludos que diz possuir a respeito dos colegas. E vetou o nome de Tião Viana.
Mais ainda: estimulou a rebelião do PMDB no Senado.
Afinal, o PMDB não é o maior partido? Não acabou de dar uma demonstração de força nas eleições municipais? Não possui a maior bancada na Câmara e a maior bancada no Senado?
Então, deve ser do PMDB a presidência do Senado.
Os deputados concordam e pensam a mesma coisa: não abrem mão de ter Michel Temer na presidência da Câmara.
Está criado o impasse.
O PT esperneou e exige que o acordo seja cumprido. Ameaça não votar em Michel Temer na Câmara, se não fizer o presidente do Senado.
Nos bastidores, a dupla Renan-Sarney, que manda uma barbaridade no governo federal desde o primeiro dia do primeiro mandato do presidente Lula, em 2003, articula a candidatura de Sarney, que não tem empecilhos dentro da bancada do PMDB e mesmo na oposição.
Mas no PT, Delcídio Amaral se assanhou e está pronto para apresentar seu nome, já que a justificativa oficial para a confusão é apenas um veto pessoal de Renan Calheiros a Tião Viana.
No final, tudo se acerta. O que se discute é o preço. O que vai custar ao Planalto a eleição de dois aliados do presidente? Mais ministérios para o PMDB? Liberação de emendas? A garantia da vaga de vice-presidente na chapa da ministra Dilma?
Tudo pode acontecer, inclusive não acontecer nada.
Uma única certeza pemanece: o PMDB não é para amadores.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Os Farrapos dos olhos azuis

Cláudio Ribeiro - Demitri Túlio, do Jornal O Povo, de Fortaleza A íris clara, azulzíssima em muitos deles, é a digital do povo Farrapo. Também é da identidade a pele branca avermelhada, carimbada pelo sol forte que não cessa em Sobral. Isso mais entre os que vivem na zona rural. Gostam de exaltar o sobrenome. É forte. Farrapo não é apelido. Não são uma etnia, mas são tratados assim. São “da raça dos Farrapos”, como nos disse quem os indicou a procurá-los. Os Farrapos têm história a ser contada. Praticaram a endogamia por muito tempo. Casamentos em família, entre primos, mais gente do olho azul de céu que foi nascendo e esticando a linhagem. Sempre gostaram de negociar, trocar coisa velha. São um pouco reclusos. Vivem sob reminiscências de judaísmo. Há estudo disso, mas muito ainda a ser (re)descoberto. Os Farrapos são citados, por exemplo, no livro do padre João Mendes Lira, Presença dos Judeus em Sobral e Circunvizinhanças e a Dinamização da Economia Sobralense em Função do Capital Ju...

Erros judiciários: Caso Mignonette - Estado de necessidade

A 5 de Julho de 1884 naufragou o iate inglês La Mignonette. Depois de vários dias no mar, o imediato, que era o mais jovem de todos, foi morto pelos companheiros, que mais tarde alegaram estado de necessidade perante o júri. Sustentaram que não teriam sobrevivido caso não se utilizassem do cadáver para matar a fome. O júri deu um "veredicto especial", reconhecendo apenas a matéria de fato, mas deixando a questão jurídica para que a corte superior decidisse. Lord Coleridge, um dos juízes superiores, disse, entre outras considerações, o seguinte: Conservar a própria vida é, falando em geral, um dever: mas sacrificá-la pode ser o mais claro e alto dever. A necessidade moral impõe deveres dirigidos não à conservação mas ao sacrifício da sua vida pelos outros. Não é justo dizer que há uma incondicionada e ilimitada necessidade de conservar a própria vida. Necesse est ut eam, non ut viram (é necessário que eu caminhe, não que eu viva) disse Lord Bacon. Quem deve julgar o estado de ...

Astronomia: Milhares de cometas escuros podem colidir com a Terra

Da Lusa - Agência de Notícias de Portugal Londres, (Lusa) - Milhares de cometas que circulam no sistema solar podem ser um perigo para a Terra, por serem indetectáveis, o que dificulta a antecipação de um eventual impacto, alertaram quarta-feira vários astrónomos britânicos. São cerca de três mil os cometas que circulam no sistema solar e apenas 25 podem ser avistados a partir da Terra, lê-se no artigo da revista "New Scientist", assinado por Bill Napier, da Universidade de Cardiff, e por David Asher, astrónomo do Observatório da Irlanda do Norte. "Devemos alertar para o perigo invisível mas significativo que são os cometas escuros", dizem os astronómos, explicando que um cometa fica escuro quando perde a cola brilhante. Desprovido desta substância, "o trajecto de um cometa que esteja em rota de colisão com o planeta Terra pode passar despercebido ao telescópio", afirmam Napier e Asher. Nos últimos séculos, o cometa de que há registo de ter passado mais pr...