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TSE - Feijó

AÇÃO CAUTELAR Nº 3352 - FEIJÓ - AC

Relator Originário: Ministro Joaquim Barbosa

Relatora Substituta: Ministra Cármen Lúcia

Autor: José Juarez Leitão dos Santos

Advogado: Admar Gonzaga Neto

Réu: Raimundo Ferreira Pinheiro

DECISÃO

Ação cautelar. Pedido de liminar. Recurso especial. Investigação judicial eleitoral. Cassação dos diplomas de prefeito e vice-prefeito. Ação cautelar inviabilizada pela ausência de peças essenciais para aferir o direito do autor. Proximidade do deslinde da causa. Precedentes do Tribunal Superior Eleitoral. Ação cautelar a que se nega seguimento. Pedido de liminar prejudicado.

Relatório

1. Raimundo Ferreira Pinheiro ajuizou, em 22.10.2008, ação de investigação judicial eleitoral contra José Juarez Leitão dos Santos, prefeito do Município de Feijó (AC), sob alegação de prática de captação ilícita de sufrágio - mediante doação de materiais de construção, gasolina, carga de gás e outros produtos, bem como transporte irregular “de passageiros” - e “[…] impedimento do exercício de fiscalização da urna da secção eleitoral no 0052 […]” (fl. 45).

O juiz eleitoral julgou improcedentes as pretensões do autor (fl. 52). E concluiu que

a) ¿não logrou êxito o representante em comprovar as alegações de irregularidades ocorridas na 52a seção eleitoral que funcionou na localidade de Porto Rubim” (fl. 58);

b) não existe prova robusta de captação ilícita de sufrágio, pois não há

“[…]

[…] como afirmar que os tijolos, filmados e mostrados nas residências de supostos eleitores tenham sido objeto de doações dos representados, assim como não vejo como os depoimentos colhidos durante a instrução sejam imunes de inveracidades ou distorções.

[…].” (fl. 61; sic)

Raimundo Ferreira Pinheiro interpôs recurso ao qual o Tribunal Regional Eleitoral, ao afastar a preliminar de intempestividade, arguida em sustentação oral, deu provimento por meio do acórdão assim ementado (fls. 65-67):

“Ação de investigação judicial. Art. 41-A. Lei 9.504/97. Prazo para recurso: 3 (três) dias. Proposta de compra de votos em troca de tijolos, material esportivo, sacolões, dinheiro entre outros. Conjunto probatório. Suficiência. Recurso provido.

1. Preliminar de intempestividade do recurso afastada. Ainda que se trate de requisito de admissibilidade recursal, caracterizando-se como matéria de ordem pública, o STF, à unanimidade, decidiu que não pode ser suscitada quando da sustentação oral, ocorrendo a preclusão. Conforme entendimento unânime do Supremo Tribunal Federal, opera-se a preclusão quanto à faculdade de argüir a intempestividade do recurso, quando o recorrido não o faz na primeira oportunidade em que fala nos autos, a saber, suas contrarrazões (STF, Ag. Reg. nos Emb. Decl. no Ag. de Instr. 709.440-7/RS - Rel. Min. Cármen Lúcia - Julgado em 21/10/08, publicado em 06/02/09).

2. Ademais, ainda que se admitisse a possibilidade de argüição dessa preliminar, o recurso seria tempestivo. O prazo para interposição de recurso contra sentença em primeira instância que julga ação de investigação judicial é de 3 (três) dias, ainda que dentre os fatos narrados haja captação ilícita de sufrágio, vedada pelo art. 41-A da Lei 9.504/97, por não se tratar de simples representação regida por essa Lei, mas sim pela Lei Complementar 64/90.

3. Por fim, mesmo que se considerasse como representação por captação ilícita, o prazo de 24 horas foi observado. A intimação realizada pelo Diário Eletrônico, nos termos do art. 4º, §§ 3º e 4º, da Lei 11.419/06, considera-se realizada no dia útil posterior àquele em que a mesma foi disponibilizada, contando-se o prazo respectivo a partir do dia útil imediatamente posterior àquele que se considerou como da efetiva publicação.

4. Conforme inteligência do STJ (Agravo Regimental no Recurso Especial nº 334.189-RS), quando a parte intimada não goza de prerrogativa de intimação pessoal, válida é a intimação realizada pelo Diário Eletrônico ou congênere.

5. A vontade popular não deve ser desconsiderada, a menos que demonstrados fatos que configurem grave inobservância das regras que garantem a isonomia do pleito ou captação ilícita do sufrágio, quando então cabe ao Judiciário, ao seu próprio tempo e mediante o correto instrumento legal, decretar a cassação.

6. A distribuição de tijolos, troféus, vestimentas, sacolões, dinheiro ou qualquer outro benefício em troca de votos é conduta que configura infração ao art. 41-A da Lei 9.504/97, impondo-se aos responsáveis as sanções ali previstas.

7. Tendo sido cassado o registro de candidato majoritário eleito com mais de 50% dos votos válidos, anula-se a eleição, com a determinação da realização, com brevidade, de outra, nos termos do art. 224 do CE, da qual não pode participar como candidato o candidato cassado, conforme precedentes do TSE.

8. Recurso a que se dá provimento.”

À fls. 92-93 estão juntadas duas cópias do Ofício nº 344, de 25.9.2009, por meio do qual o presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Acre comunica essa decisão ao presidente da Câmara Municipal e notifica-o para assumir, provisoriamente, o cargo de prefeito.

Cópia da petição de embargos de declaração, protocolada em 21.9.2009, e a do recurso especial, interposto em 30.9.2009, foram juntadas, respectivamente, às fls. 95-139 e às fls. 140-247.

Cópia das instruções para a realização de novas eleições às fls. 248-276.

José Juarez Leitão dos Santos, prefeito eleito, ingressa com esta ação cautelar, com pedido de liminar, para

“[…]

[…] a suspensão da execução do v. acórdão recorrido até julgamento por essa eg. Corte do recurso especial já admitido na origem, e assim que V. Exa. determine a recondução dos Requerentes aos cargos para os quais foram eleitos, ou, alternativamente, a suspensão da eleição já programada por meio da Resolução anexa. […].” (fl. 42; destaques do original)

Quanto à possibilidade de êxito do especial, que recebeu juízo positivo de admissibilidade, alega nele demonstrar que:

1º) o recurso da sentença é intempestivo;

2º) o Tribunal Regional Eleitoral o condenou por fato não relatado na inicial, o que viola o devido processo legal;

3º) não há provas da ocorrência da captação ilícita de sufrágio;

4º) foram utilizadas provas clandestinas para condená-lo.

Afirma que o perigo da demora sustenta-se na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, segundo a qual ¿[…] o afastamento do titular do exercício de mandato eletivo configura hipótese manifesta de dano irreparável” (fl. 34), e no fato de que o Tribunal Regional publicou a Resolução nº 1.342/09. Nela, estabeleceu as normas para novas eleições a serem realizadas em 22.11.2009, devendo o pedido de registro de candidaturas ser apresentado em 26.10.2009.

Noticia que a referida resolução também fixou o calendário eleitoral para a realização de eleições em Sena Madureira, suspensas por decisão proferida pelo Ministro Felix Fischer nos autos da Ação Cautelar nº 3.346.

Os autos vieram-me conclusos por se tratar de ação conexa com o Mandado de Segurança nº 4.251.

Examinados os elementos constantes dos autos, DECIDO.

2. Esta ação cautelar não deve ser processada, por deficiência em sua formação.

A cópia do Acórdão nº 1.709 (fls. 65-91) está incompleta e não há cópia da certidão de sua publicação; assim como não se verifica cópia do acórdão que julgou os embargos de declaração, tampouco a da certidão de quando ele foi publicado. Logo, faltam peças essenciais para apreciar os pedidos do autor e, por tal razão, é aplicável a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral para indeferir a inicial.

Nessa direção, podem ser mencionados os seguintes precedentes:

“AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO. AUSÊNCIA. PEÇAS QUE IMPEDEM O EXAME DA PLAUSIBILIDADE DO DIREITO.

1. A cópia da decisão a que se pretende atribuir efeito suspensivo, bem como sua respectiva certidão de publicação, são peças essenciais à instrução da ação cautelar para que se possa aferir a plausibilidade do direito invocado.

2. A regularização da representação processual, em sede extraordinária, pressupõe a existência de protesto pela juntada posterior do instrumento de mandato.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (Acórdão nº 3.265, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 30.6.2009)

“AÇÃO CAUTELAR. AGRAVO REGIMENTAL QUE NÃO ATACA FUNDAMENTOS DA DECISÃO DE MÉRITO AGRAVADA. JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS APÓS A PROPOSITURA DA AÇÃO. ART. 397, CPC. INDEFERIMENTO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO IMPROVIDO.” (Acórdão nº 3.235, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.5.2009)

Ainda que assim não fosse, a complexidade do caso recomenda cautela e, para tanto, deve prevalecer a decisão recorrida.

O Tribunal Regional Eleitoral do Acre analisou e afastou em duas ocasiões a questão suscitada, relativa à intempestividade do recurso interposto contra a sentença; rejeitou todas as questões preliminares e prejudiciais ao exame de mérito; e concluiu, à luz das provas, que os fatos levados à sua apreciação caracterizavam captação ilícita de sufrágio. É evidente, pois, que “o interesse público se sobrepõe ao particular no sentido de ver bem conduzido o processo eleitoral” (Acórdão nº 6.506, Rel. Min. José Delgado, 1º.6.2006) e, até que o Tribunal Superior analise o recurso especial, a decisão recorrida deve prevalecer.

Ressalto, por fim, que o deslinde desta causa está prestes a acontecer, pois o recurso especial eleitoral referente à presente ação cautelar foi admitido e logo deverá ser recebido no Tribunal Superior Eleitoral. Assim, verifico ser prudente aguardar o julgamento do mérito do recurso em que se discute essas questões.

3. Pelo exposto, nego seguimento a esta ação cautelar e declaro prejudicado o pedido de liminar.

Diga o autor, em cinco dias, se tem interesse no prosseguimento do feito. Dê-se ciência à Procuradoria-Geral Eleitoral. Oportunamente, arquive-se. Comunique-se imediatamente.

Publique-se.

Brasília, 29 de outubro de 2009.

Ministra Cármen Lúcia

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