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Juristas pedem revisão da Lei de Anistia no STF

Os torturadores não representavam a sua instituição quando cometiam atrocidades, diz Dalmo Dallari

Marcela Rocha
Especial para Terra Magazine

A Associação Juízes para a Democracia (AJD) requereu ingresso no processo proposto pelo Conselho Federal da OAB que questiona a extensão da Lei de Anistia, de 1979, para casos de tortura.

A Ação Declaratória de Preceito Fundamental (ADPF) questiona o dispositivo do artigo 1º, § 1º da Lei de Anistia. A OAB pede que o Supremo Tribunal Federal interprete a norma à luz dos preceitos fundamentais. Noutras palavras: que a Anistia não se estenda aos crimes comuns praticados pelos agentes da repressão contra os opositores políticos da ditadura militar.

Subscrevem a petição de Fábio Konder Comparato e Mauricio Gentil Monteiro, os juristas Dalmo de Abreu Dallari, Celso Antonio Bandeira de Mello, Pierpaolo Cruz Bottini e Igor Tamasauskas.

Leia também:
» Anistia a Lamarca fere "brios militares"
» Frei Betto: Lei de Anistia é "aberração jurídica"

Dallari e o ex-deputado federal Nina Ribeiro divergem sobre a interpretação da Anistia. Para o primeiro, a revisão é necessária para que seja consolidada a democracia "sob os preceitos da lei". Já para o segundo, "isto é fruto da mistura intencional de política com a ciência do Direito".

O Artigo V da Declaração Universal dos Direitos Humanos - que em 2008 completa 60 anos - diz: "Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante". Em entrevista a Terra Magazine, Dallari retoma a Declaração e enfatiza que "tortura é um crime contra a humanidade".

O professor de Direito justifica o seu posicionamento:

- Os torturadores não representavam a sua instituição quando cometiam atrocidades. Portanto, queremos que o Estado os investigue e, caso julgados culpados, sejam reconhecidos individualmente como tal - avalia Dallari.

Segundo o ex-deputado federal e ex-professor de Direito Penal da PUC-RJ, Nina Ribeiro, é um anacronismo propor que uma lei julgue como crimes atos cometidos quando ela ainda não existia. E prossegue: "As torturas aconteceram num momento em que ainda não havia uma lei condenando esse ato como criminoso", refuta o advogado de militares.

- Querem fazer uma agitação política e estão usando o Direito Penal como instrumento. Mas é preciso lembrar que o Direito é uma ciência e que a OAB não é invencível, analisa Ribeiro.

O jurista Dalmo Dallari, membro da AJD, reforça a necessidade de se rediscutir o Artigo 1º da Lei de Anistia porque, segundo ele, "o Estado não os orientava (os militares) a torturar". Prossegue: "Portanto devem ser julgados individualmente".

Em nota, a AJD afirma que esta ação declaratória é "um marco para a democracia brasileira". Mais à frente ressalta que o cumprimento do Direito à Justiça faz parte do processo de transição à democracia e que isto torna necessário "investigar, processar e punir; oferecer reparação adequada de caráter monetário ou não; revelar a verdade para as vítimas, familiares e sociedade e exige reformas institucionais com a reorganização do Estado".

Terra Magazine

Comentários

Anônimo disse…
Além de ser um completo despropósito essa revisão, ADPF é sigla de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental e não Ação Declaratória de Preceito Fundamental.

Francisco de Vitória
Anônimo disse…
Além de ser um completo despropósito essa revisão, ADPF é sigla de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental e não Ação Declaratória de Preceito Fundamental.

Francisco de Vitória
Anônimo disse…
Vamos "investigar, processar e punir", mas a todos, inclusive os da esquerda, hoje no poder, que tambem mataram, roubaram e torturaram.
Anônimo disse…
Anistia houve para os dois lados. Aplica-se para ambos, ou para nenhum. Apesar da anistia, algumas estão isentas de punição e até sendo polpudamente indenizadas, enquanto outras devem ser rigorosamente punidas pela prática dos mesmos atos praticados pelos primeiros, apenas por haverem pertencido, na ocasião, a lados opostos? Onde a coerência?

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